Sem futebol, árbitros recorrem a auxílio emergencial do governo federal

Por Redação

Longe do apito, dos cartões e das partidas de futebol, o árbitro potiguar Diêgo Leonardo Santana, de 29 anos, tem uma preocupação bem delicada desde que a pandemia do novo coronavírus paralisou o calendário de competições. Assim como ele, muitos outros árbitros que dependem exclusivamente da remuneração pelo trabalho em partidas profissionais deixaram de ganhar dinheiro e precisaram recorrer ao auxílio emergencial de R$ 600 do governo federal para poder bancar as próprias despesas.

A profissão de árbitro de futebol não é regulamentada no País, mas muitos brasileiros dependem só desse trabalho para sobreviver. Segundo a Associação Nacional dos Árbitros de Futebol (Anaf), existem no país cerca de 10 mil habilitados para apitar. A própria Anaf, federações estaduais e sindicatos de árbitros consultados pela reportagem estimam que pelo menos 5 mil árbitros não exerçam regularmente outra atividade remunerada fora do futebol.

No Campeonato Potiguar, onde Diêgo Santana atua, o árbitro costuma receber cerca de R$ 1,3 mil por jogo. A remuneração é variável de acordo com a competição e pode chegar até mesmo a mais de R$ 4 mil em partidas do Campeonato Brasileiro. “Só 15 árbitros do Brasil conseguem receber uma média de R$ 25 mil por mês. Já uns 60% do total ganha até R$ 2 mil por jogo apitado”, disse o presidente da Anaf, Salmo Valentim.

No caso de Diêgo Santana, o auxílio de R$ 600 recebido do governo amenizou ainda o problema de não conseguir alunos para as aulas como personal trainer durante a pandemia. “Eu consegui remanejar algumas contas. Tenho um filho de 3 anos e negociei a mensalidade da escola. Estava quitando as prestações de uma moto, mas tive de congelar o pagamento”, contou.

Árbitro do quadro da CBF, o pernambucano Gleydson Leite, de 43 anos, foi outro a ter recorrido ao auxílio do governo. Ele chegou até apitar uma partida com os portões fechados pouco antes da paralisação pela pandemia, mas não ficou à vontade. “Pela primeira vez em 18 anos de carreira eu entrei em campo e não tinha ninguém para me xingar. O futebol faz muita falta, porque eu gosto de estar em campo. A parte financeira ficou complicada com essa pandemia”, afirmou.

Outro pernambucano, Tiago Nascimento, de 38, passou dificuldades antes de conseguir receber o auxílio do governo federal. “Minha reserva financeira acabou logo, porque eu vivo de arbitragem e não tenho emprego formal. Eu contei a ajuda de alguns familiares”, contou. No ano passado ele atuou em mais de 20 jogos, principalmente nas Séries C e D do Brasileiro.

A ausência de jogos levou várias entidades ligadas ao futebol a organizarem doações na pandemia. A CBF repassou R$ 1,8 milhões para a Anaf distribuir entre mais de 4 mil árbitros federados. Em Estados como Amazonas, Pernambuco, Rio Grande do Norte, Ceará e Alagoas as federações e sindicatos realizaram ajudas variadas, desde o adiantamento de taxas a até doações de cestas básicas.

O presidente da Comissão de Arbitragem da Federação Cearense de Futebol, Paulo Sílvio, explicou que dos 130 árbitros do Estado, 86 estavam em situação delicada e sem fonte de renda. “Nós fizemos transferências com o valor mínimo de R$ 200. Ao todo vamos distribuir R$ 28 mil. O problema da pandemia é que os juízes não conseguem trabalhar nem mesmo em ligas amadoras e na várzea, que ajudam a completar o orçamento deles”, afirmou.

Morador de Fortaleza, Wesley Pacheco, de 26 anos, foi outro árbitro a ter recorrido ao auxílio do governo federal. “Eu costumo apitar cinco jogos por semana, seja pelo Campeonato Cearense ou jogos amadores. Com a paralisação, perdi mais da metade da minha renda”, contou.

PARTE FÍSICA – O dinheiro não é o único problema dos árbitros com a paralisação pela pandemia. A falta de prática e a necessidade de manter a forma física causam preocupação. Por isso, as federações e a CBF têm produzido um guia de exercícios para ser feitos em casa. Outra parte do conteúdo se trata de vídeos e exercícios práticos, em que os árbitros precisam analisar e tomar decisões sobre situações de jogo e a aplicação da regra.

“Quando o calendário voltar, vamos sentir a dificuldade como se fosse o primeiro jogo do ano. Fisicamente vamos ter de recuperar o ritmo”, explicou o árbitro pernambucano Tiago Nascimento. Treinos funcionais e alongamentos têm sido a maior ferramenta para manter a atividade neste período.

Em Natal, o árbitro Carlos Alberto de Berto, de 33 anos, arrumou um jeito diferente de se manter na ativa. Porteiro de um condomínio, ele abriu mão do transporte público. “Vou ao trabalho de bicicleta, então já é um exercício bom. A situação geral mudou muito para os árbitros, até mais do que em comparação aos jogadores. Nós estamos com dificuldades para treinar e para manter nossas contas em dia”, explicou.

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