A Polícia Civil do Espírito Santo concluiu o inquérito sobre a morte de Danilo Lipaus Matos, de 20 anos, ocorrida durante uma ação da Polícia Militar, na madrugada do dia 1º de fevereiro deste ano, no bairro Aeroporto, em Colatina. As investigações apontaram que houve uma sequência de erros e falhas de comunicação entre policiais durante as abordagens, que acabaram resultando na morte de Danilo.
Quatro policiais militares vão responder pela morte do jovem. Dois vão responder por homicídio culposo (que será julgado pela Justiça Militar) e outros dois por tentativa de homicídio. O caso será encaminhado ao Ministério Público.
Imagens divulgadas pela Polícia Civil, nesta segunda-feira (5), mostram a dinâmica dos fatos que levaram a morte do jovem. Entenda:
1ª tentativa de abordagem
De acordo com o delegado Tarik Souki, responsável pela investigação, a primeira abordagem ao veículo onde estava Danilo aconteceu poucos minutos depois da meia noite. Ele dirigia uma caminhonete com amigos na carroceria, o que despertou a atenção dos policiais militares.
“Policiais em duas viaturas percebem o carro vindo e dão ordem de parada a Danilo. Ele para, os policiais ordenam que todos desembarquem e os jovens descem da carroceria, mas Danilo acelera e foge com uma pessoa no banco do carona” explica o delegado.
Segundo o Tarik, os policiais não vão atrás de Danilo, neste primeiro momento. Eles fazem uma abordagem aos jovens que estavam na carroceria e nada de ilícito é encontrado com eles. Logo depois, os policiais passam a informação, via rádio, de que uma Fiat Strada branca com duas pessoas havia fugido de uma abordagem.
Policiais acharam que Danilo estava envolvido em outro crime
De acordo com a investigação, a fuga do jovem levantou suspeitas porque, momentos antes, uma caminhonete S10 branca havia sido roubada em uma cidade vizinha e estava circulando por Colatina. O veículo foi recuperado no alto do morro no bairro São Braz, mas os suspeitos — que estariam armados — fugiram a pé. Os policiais miliares, então, passaram a desconfiar que a caminhonete dirigida por Danilo poderia estar dando cobertura a estes criminosos.
2ª tentativa de abordagem
Minutos depois, acontece uma nova tentativa de abordagem a Danilo, em outro ponto da cidade. Uma viatura da PM encontra com o Danilo vindo de frente. Os policiais, então, freiam, impedindo a passagem, mas o jovem engata a marcha ré, e da início a segunda tentativa de fuga. O policial que está no carona da viatura desce e grita para Danilo parar, mas ele foge. Veja:
3ª tentativa de abordagem
Na sequência, mais uma tentativa de parar o veículo. Danilo acaba encontrando com uma viatura, com três policiais dentro, que foram avisados de que a caminhonete estava em fuga.
Eles fizeram um cerco esperando pelo jovem e, quando ele passa, os policiais desembarcam da viatura e dão ordem de parada, mas Danilo passa em alta velocidade, pelo lado do motorista, e foge.
“O policial narra que acreditou que fosse ser atropelado e por isso, ele pulou para dentro da viatura e efetuou um disparo. O outro policial diz que estava do lado fora, com a porta aberta, e quando Danilo passa, ele também efetua quatro disparos na lataria do carro. Mas argumentações deles não se sustentaram, porque as imagens mostram que mesmo após a passagem do veículo, há disparo na parte de trás do carro”, comentou o delegado.
Após a caminhonete ser atingida por tiros, Danilo então faz uma curva e um homem de cabelo vermelho, que está dentro do carro com ele, no banco do carona, joga pela janela um objeto metálico e aparentemente pesado, que cai no meio da rua. Os policiais acreditaram que o objeto era uma arma e repassaram a informação via rádio de que dois homens, supostamente armados estariam em fuga. Porém, de acordo com o delegado Tarik Souki, a perícia não conseguiu confirmar o que o objeto realmente era.
“Analisamos as imagens dezenas de vezes e fomos perceber apenas alguns dias depois que alguém joga algo pela janela do carro. Nós voltamos ao local e pedimos imagens de videomonitoramento de uma casa da região, mas o morador explicou que as imagens foram sobrepostas, com outras gravações, então não tem como saber se alguém voltou ao local para buscar o objeto ou verificar do que se tratava”, explica Tarik.
A fuga continua e, em determinado momento, o homem de cabelo vermelho, que estava com Danilo, sai da caminhonete Strada e tenta se esconder entre os carros estacionados. Ele corre a pé e Danilo foge com o veículo mais uma vez.
Última abordagem – mais de 40 tiros são disparados
A perseguição termina após Danilo tentar furar o cerco da PM novamente em outro ponto da cidade, já no bairro Aeroporto. Ele é interceptado e os militares disparam mais de 40 tiros. Cinco deles atingem e matam o rapaz.
Segundo o delegado, os disparos aconteceram por um equívoco dos policiais, que acreditaram que Danilo havia trocado tiros com outros PMs.
“Os policias que estavam próximo a caminhonete S10 – que anteriormente havia sido roubada e recuperada – no alto de morro no bairro São Braz, escutaram os tiros [disparados pelos outros policiais na terceira tentativa de abordagem] e, equivocadamente supuseram que era uma troca de tiros com criminosos. Eles repassaram essa informação via rádio: ‘Troca de tiros, troca de tiros'”, descreveu Tarik.
“Na cabeça deles [policiais que atiraram contra Danilo], eles estavam convictos que estavam agindo em legitima defesa, só que era uma legitima defesa ilusória. Eles achavam que tinham acabado de encontrar um veiculo com indivíduos que atiraram contra a guarnição deles”, explicou o delegado.
Uso desproporcional da força
Tarik também afirmou que durante a última abordagem houve uso desproporcional da força.
“Ocorreu um erro nessa situação, que chamamos de erro evitável, em razão da falta de cautela, da falta de uma devida atenção, e houve uma desproporcionalidade, pela quantidade de disparos [mais de 40] feitos contra o jovem”, destacou.
Fugiu porque tinha medo de perder a CNH
Durante as investigações, o carona que estava com Danilo foi encontrado e ouvido pela polícia. Ele afirmou que o amigo estava com medo de perder a carteira de motorista e por isso tentou fugir das abordagens.
Ao ser questionado sobre a arma, supostamente lançada de dentro do carro para fora, ele disse estar embriagado e que não lembra o que era.
Indiciamentos
Com base na apuração, a Polícia Civil indiciou os policiais militares que participaram da terceira abordagem por tentativa de homicídio. Já os outros deverão ser julgados pela Justiça Militar.
“Esses policiais podem responder pelo crime de homicídio culposo. Porém, este crime, quando praticado por policial militar, no exercício de suas funções, é um crime militar e a Polícia Civil não tem atribuição para indiciar policiais militares, por crimes militares. Por esse motivo, nós só indiciamos os policias envolvidos na terceira tentativa de abordagem a Danilo, pela tentativa de homicídio contra o jovem. Quanto aos policiais relacionados a última tentativa de abordagem, nós não os indiciamos e remetemos o inquérito ao promotor de Justiça, que é o titular da ação penal, e ele sim vai decidir se vai denunciar esses policiais por homicídio doloso ou entender que houve legítima defesa”, finalizou.
O inquérito agora segue para o Ministério Público, que irá decidir se denuncia ou não os policiais envolvidos.