Com todas as principais competições esportivas paralisadas em razão da pandemia do novo coronavírus e em meio a um cenário cheio de incertezas provocado pela covid-19, algumas mudanças têm sido especuladas no meio do futebol, especialmente depois que o presidente da Fifa, Gianni Infantino, disse que o momento pode ser propício para uma reforma global da modalidade. O suíço-italiano que comanda a entidade máxima do futebol falou sobre a proposta de campeonatos mais curtos, com menos jogos e equipes, mas com maior interesse e equilíbrio.
O Estado ouviu dirigentes, treinadores e ex-jogadores para saber quais os caminhos possíveis para o futebol a curto prazo, assim que a disseminação do vírus for controlada e os torneios forem retomados, e também mais a longo prazo, nos próximos anos. Dentro de possíveis mudanças, eles divergiram quanto à unificação do calendário brasileiro com o europeu, mas todos concordaram que a CBF deve ajudar os clubes e jogadores para aliviar o impacto dessa crise. Também avaliaram o momento atual como oportuno para melhorar o futebol nacional.
“É difícil opinar sobre algo que a gente não tem experiência. Temos de levar em conta as nossas peculiaridades, nosso clima, aspectos culturais, férias coletivas. Tem que fazer um estudo mais aprofundado. Prefiro não ficar opinando de forma superficial sobre algo não experimentado”, explicou o diretor executivo do Internacional, Rodrigo Caetano.
Por outro lado, o diretor executivo de futebol do Grêmio, Klauss Câmara, entende que a adaptação do calendário brasileiro ao do que está em vigência na Europa, que começa em agosto e termina em maio, seria positiva para os clubes e jogadores por aqui já neste ano, assim que os torneios forem retomados.
“Esse impacto do coronavírus no futebol significa uma grande oportunidade para todos nós de termos um calendário unificado, de debater sobre vários pontos importantes. A unificação, principalmente, seria um grande avanço, ainda mais diante desse cenário caótico causado pela pandemia. Poderíamos fazer, por exemplo, um calendário de junho desse ano a maio do próximo ano”, avaliou o dirigente gremista.
Para Klauss, as principais vantagens de ter datas semelhantes às da Europa no Brasil são a redução do número de jogos, a ampliação do período de pré-temporada e a possibilidade de realizar vendas de jogadores em início da temporada, o que traria, na visão do dirigente, aumento considerável de receita com a permanência de atletas importantes até o final da jornada.
Ex-técnico de Botafogo, Santos e Corinthians, Jair Ventura endossa a análise de Klauss. “Não sei o pensamento dos clubes. Mas se o modelo é a Europa, talvez seja melhor repensar e ter essa mudança. Na Argentina já é assim. Quando time brasileiro vai jogar a pré-Libertadores, está com 15 dias de pré-temporada enquanto um time chileno está no meio do ano”, afirmou o técnico, atualmente sem clube.
Milton Cruz, ex-coordenador e ex-treinador do São Paulo, considera que é possível se acostumar sem problema a um novo calendário. O técnico, desempregado no momento, destaca que o atual formato traz prejuízo financeiro aos clubes e atrapalha o desempenho dos jogadores.
“Muitas vezes, os jogadores não têm a menor condição de jogar, mas entram em campo porque são profissionais e têm caráter, mesmo sabendo que não podem render bem. Isso mudaria se houvesse menos jogos, não quarta e domingo, sem tempo de preparação adequada, como é hoje”, salientou.
Pentacampeão mundial com a seleção brasileira, Luizão apontou para a necessidade de mudanças na estrutura do futebol brasileiro, mas alertou que elas devem acontecer de forma gradativa.
“O coronavírus chegou e agora é que vão falar em mudanças? Tem que pensar bem antes para programar o futebol. Não é por causa da pandemia que tudo tem que ser mudado. O futebol tem que ser mudado gradativamente, aos poucos. Na Europa acho que é mais fácil de mudar, mas aqui no Brasil é complicado fazer isso de uma hora pra outra”, analisou o ex-jogador.
No cenário de caos estimulado pelo coronavírus, os clubes mais afetados são os menores. Nessa realidade está inserido o Santo André, time de melhor campanha do Campeonato Paulista e que perderá a maior parte do elenco em função do fim dos contratos dos atletas, da comissão técnica e até do diretor executivo Edgard Montemort.
“Temos que mirar nossos esforços para sair dessa crise de saúde da melhor forma possível para depois a gente sentar e ver o que pode ser feito. Unir forças é fundamental e os atletas não só olharem para si. É hora de todo mundo se unir para fazer o futebol melhor”, disse Montemort, que chamou a atenção para a necessidade de se criar um calendário capaz de abranger os times de menor expressão.
“Todo mundo cobra que os clubes sejam administrados como empresas, mas como se faz um planejamento para uma competição de três meses, sendo que depois no quarto mês do ano tem que mandar todo mundo embora para manter as contas em dia? Os clubes vão se planejando de quatro em quatro meses. Isso não existe. Não é saudável. Eu vejo que é hora de a gente pensar um calendário de que todos possam participar”, ressaltou.