Ministério Público conseguiu registro civil para “Clarinha” um dia antes da morte de paciente

Por Mariana Cicilioti

O Ministério Público do Estado do Espírito Santo (MPES) conseguiu, junto a Justiça, na última quarta-feira (13), o pedido para determinar o registro de nascimento tardio da paciente ‘Clarinha’, que esteve internada no Hospital da Polícia Militar (HPM), em estado vegetativo e sem identificação desde 2000. Porém, para infelicidade do destino, Clarinha acabou morrendo no dia seguinte a decisão, após sofrer um mal súbito no hospital.

Apesar da triste coincidência, acredita-se que, com a decisão judicial, “Clarinha” não será enterrada como indigente. Isso porque, além do registro, o Coronel da Polícia Militar Jorge Potratz, que, ao longo dos anos, carinhosamente cuidou de Clarinha, se prontificou a atuar como responsável da mulher para realizar a liberação do corpo, sepultamento e demais providências relacionadas ao óbito.

De acordo com o MPES, será feita solicitação judicial para que a certidão de óbito seja lavrada em nome de “Clarinha”, contendo informações como o local definitivo do sepultamento do corpo, além do registro fotográfico e papiloscópico dela, a fim de viabilizar eventuais esclarecimentos caso surja, no futuro, fato novo.

Após a morte de Clarinha, 3 famílias apareceram para fazer exames de DNA

Na sexta-feira (15), após a divulgação da morte de Clarinha três famílias entraram em contato com o Ministério Público, manifestando interesse na realização de exame de DNA, a fim de confirmar possível parentesco. O órgão informou que busca junto às entidades competentes auxílio com relação a essas demandas.

Tentativas de identificação

Ao longo de anos, várias tentativas foram feitas para chegar a uma identificação de “Clarinha”.  Segundo o MPES, o Grupo Especial de Trabalho Social (Getso), coordenado na época pela Promotora de Justiça Arlinda Maria Barros Monjardim, atuou em diversas frentes, expedindo ofícios, fazendo diligências e cobrando perícias. Após a extinção do Getso, os trabalhos de investigação tiveram continuidade com a 28ª Promotora de Justiça Cível de Vitória, que adotou diversas providências, expandindo o espectro de busca pela identificação.

A hoje Procuradora de Justiça Edwirges Dias, que na época atuava como Promotora de Justiça, expediu ofícios para diversas instituições públicas que integraram uma campanha para saber quem era “Clarinha”.  Também se buscou auxílio junto a outros Ministérios Públicos, em bancos de dados de pessoas desaparecidas, em delegacias e junto a registros da Polícia Federal.

Após uma reportagem em um programa nacional em 2016, 102 famílias procuraram o MPES tentando identificar “Clarinha” como uma possível parente desaparecida. Desse total, 22 casos chamaram mais atenção, pelas fotos ou pela similaridade dos dados próximos ao perfil pretérito de “Clarinha”. Depois de uma triagem mais detalhada, quatro casos foram descartados, devido à incompatibilidade de informações ou pelo fato de as pessoas procuradas já terem sido encontradas. O MPES dividiu as 18 pessoas restantes em dois grupos para a realização dos exames de DNA. No entanto, os resultados mostraram-se incompatíveis para traços familiares.

Comparação facial

Em meados de 2020, uma equipe de papiloscopistas da Força Nacional de Segurança Pública (FNSP) em atuação no Estado tomou conhecimento do caso e, em contato com o MPES, obteve autorização para auxiliar na tentativa de identificação da paciente. A equipe utilizou o processo de comparação facial, com buscas em bancos de dados de pessoas desaparecidas com características físicas semelhantes às de “Clarinha”.

A partir dessas buscas, chegou-se ao caso de uma criança de 1 ano e 9 meses de idade desaparecida em Guarapari, em 1976. Na época dos fatos, a família dela, que é de Minas Gerais, passava férias no Espírito Santo.

Foi solicitada a realização de exame por uma empresa especializada em reconhecimento facial localizada no Paraná. O exame concluiu haver “compatibilidade” entre as imagens de “Clarinha” e a da menina desaparecida em 1976.

Com esses novos elementos, o MPES requisitou ao Laboratório Tomasi o perfil genético de “Clarinha”. O laboratório, que foi parceiro da instituição no atendimento desse caso, realizou, anteriormente, os exames de DNA com supostos parentes consanguíneos da paciente. Após essa coleta, o MPES enviou o material genético para a Polícia Civil de Minas Gerais, onde está arquivado o perfil genético dos pais da criança desaparecida em Guarapari, para realização de comparação entre os perfis genéticos.

Contudo, em agosto de 2021, após a realização dos exames de DNA, a Polícia Civil de Minas Gerais informou que o material genético da “Clarinha” não era compatível com o material genético da criança desaparecida em 1976.

Atropelamento

“Clarinha” chegou ao HPM em 2000. De acordo com relatos de testemunhas, estava fugindo de um perseguidor, também não identificado, e correu para o meio de uma avenida movimentada no Centro de Vitória, onde foi atropelada por um ônibus. Levada para o antigo Hospital São Lucas, passou por diversas cirurgias. O cérebro foi afetado, impedindo que ela retornasse de um coma profundo.

Sem documentos e com as digitais desgastadas, buscou-se, em um primeiro momento, encontrar algum conhecido entre as testemunhas do acidente, mas ninguém tinha informações da paciente. Em seguida, “Clarinha” foi transferida para o HPM, onde permaneceu, sendo tratada com carinho pelo corpo médico e pelos enfermeiros.

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