Com as salas da Reserva Cultural fechadas, em São Paulo e em Niterói, o empresário Jean-Thomas Bernardini está tendo de se reinventar. Sua distribuidora, a Imovision, estava parada, mas voltou a lançar os títulos de sua cartela autoral. O primeiro fim de semana, o passado, foi de comemoração. Mais de 500 Blu-Ray e DVDs vendidos. A expectativa é de que o sucesso da loja virtual prossiga aquecido, mas essa sexta-feira, 1º, antecipa-se como especial.
Num dia de feriado, as salas no conjunto da Paulista estariam lotadas, mas agora Jean-Thomas espera que a corrida seja para o streaming da Imovision que, a partir da meia-noite de quinta, ou da 0 h de sexta, estará disponibilizando, de graça, em pré-estreia mundial, o novo filme do chileno Pablo Larraín, Ema. Em tempos de pandemia, quando as pessoas que podem estão isoladas em casa, a produtora de Larraín e seus parceiros em 50 países de todo o mundo estarão liberando Ema por 24 horas, como aperitivo para o futuro lançamento do longa.
Larraín, de 43 anos, é um dos mais conhecidos diretores do Chile. Concorreu ao Oscar em 2013, por No, ao Globo de Ouro em 2015, por O Clube. Antes desses, havia feito Fuga, Tony Manero e Post-Mortem. Depois, Neruda e Jackie, sua cinebiografia da ex-primeira dama norte-americana Jacqueline Kennedy, com recorte no período que se seguiu ao assassinato de seu marido e a luta dela para transformar o funeral do presidente num espetáculo de Estado que serviu como trampolim para a sua glória póstuma.
O novo filme, com Mariana Di Girolamo e Gael García Bernal, estreou em Veneza no ano passado e, logo em seguida, foi para outro grande festival, Toronto. O lançamento em streaming terá a presença virtual da atriz principal em ações promocionais – basta entrar no site da Imovision e seguir as indicações.
O filme conta a história de um coreógrafo (Gael) e sua mulher bailarina (Mariana). A relação azeda depois que adotam um menino que provoca um incêndio (e deforma o rosto da irmã dela). Estão a ponto de se separar. Jean-Thomas diz que é um filme estranho, que parece ir numa direção, mas muda o rumo e, no final, tem uma reviravolta que ele, como espectador, achou sensacional. “Tenho certeza de que o público vai amar!”, garante.
Ele diz isso com a convicção de quem conseguiu montar uma rede de salas e uma distribuidora independentes, voltadas ao cinema autoral. Há tempos, Jean-Thomas tenta criar as própria operadora de streaming. Possui uma cartela de 500 títulos em operação, que chega a 1000 graças a novos acordos renegociados com produtores e diretores. A burocracia da Ancine tem dificultado e ele espera a regularização desse mercado para se lançar nele. Enquanto isso, e atendendo a pedidos do público, voltou ao DVD e ao Blu-Ray.
Nos últimos tempos, o streaming ganhou força principalmente entre os jovens, que não se importam de ver os filmes em diferentes mídias e plataformas. TV, laptop, iPad, iPhone. Mas ainda tem um segmento – os cinéfilos – que mantém uma relação de fetiche com o filme.
“São pessoas que cultivam o filme como objeto físico, que gostam de tê-lo em mãos”, reflete Jean-Thomas. Esse público vivia cobrando dele a reoperacionalidade da Imovision distribuidora de home vídeo. Ele capitulou – e tem sido ótimo. “Meu grande problema, como o da imensa maioria de empresários conscientes, era como manter a equipe nessa fase de cinemas fechados.
O DVD e o Blu-Ray mantêm todo mundo trabalhando, e recebendo. Tem de fazer a seleção, a divulgação, receber os pedidos, embalar as fitas, despachar pelo correio. Aqui, anda todo o mundo a mil.” Na semana passada, o site da Imovision recebeu os pedidos de pré-vendas, que foram efetivadas a partir das 13 h de sexta, 24. Neste final de semana, a previsão é de que as pessoas já estejam recebendo as peças em casa.
Os mais vendidos? Três nacionais, e pernambucanos, lideram no Blu-Ray: Boi Neon, de Gabriel Mascaro; Tatuagem, de Hilton Lacerda; e Aquarius, de Kléber Mendonça Filho. Em DVD, outro nacional, As Boas Maneiras, de Juliana Rojas e Marco Dutra, e dois estrangeiros: Garota Sombria Caminha pela Noite, de Ana Lily Amirpour, e A Fita Branca, de Michael Haneke. A expectativa: quem vai vender mais nesse sábado e domingo?
Um assunto do qual não dá para fugir – a reabertura das salas. Quando? “Não será uma decisão nossa, mas das autoridades. O governo do Estado e a prefeitura estão anunciando um retorno gradual em maio, a partir de 11. Os setores vão reabrir aos poucos. O cinema coloca problemas específicos devido à aglomeração. As poltronas são coladas, as pessoas sentam juntas.
Além dos cuidados de higienização, temperatura, todos os cuidados que se aplicam aos diferentes seguimentos, vamos para ter a nossa questão específica.” Numa sala de 200 lugares, poderão ser alojados quantos espectadores em segurança? A metade? Um quarto? Numa sala de 200 lugares, e as salas lotam no fim de semana, compensando o público menor dos outros dias, a diminuição obrigatória de espectadores compensará o custo? “É uma questão séria, que precisa ser resolvida, Estou louco para reabrir, e o nosso público também. Cinéfilo quer a fruição, quer ver o filme nas melhores condições, não de qualquer jeito.
Mas isso tem de ser feito com responsabilidade. Já pensou reabrir, e haver contaminação? Mais do que no negócio, temos de pensar nas pessoas.”