Do R7 -Uma megaoperação realizada nesta quinta-feira (28) cumpre mandados de busca e apreensão em oito estados, no âmbito de investigações sobre um esquema criminoso no setor de combustíveis, supostamente comandado por integrantes do PCC (Primeiro Comando da Capital).
O MPSP (Ministério Público de São Paulo) afirmou que mais de R$ 7,6 bilhões foram sonegados. Segundo as investigações, mais de mil postos ligados aos investigados movimentaram R$ 52 bilhões entre 2020 e 2024. No Espírito Santo foi cumprido um mandado, mas ainda não foi divulgado quem foi o alvo.
Mais de 350 alvos, entre pessoas físicas e empresas, são suspeitos de crimes como adulteração de combustíveis, crimes ambientais, lavagem de dinheiro e estelionato.
A Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional também ingressou com ações judiciais cíveis de bloqueio de mais de R$ 1 bilhão em bens dos envolvidos, incluindo imóveis e veículos, para a garantia do crédito tributário.
Segundo os investigadores, diversas irregularidades foram descobertas em diferentes etapas da cadeia de combustíveis, desde a produção até a distribuição, lesando não só motoristas, mas todo o setor.
Um “sofisticado esquema” criado pela facção, possibilitava a lavagem do dinheiro e a obtenção de altos lucros nesta cadeia econômica. “O uso de centenas de empresas operacionais na fraude permitia dissimular os recursos de origem criminosa. A sonegação fiscal e a adulteração de produtos aumentavam os lucros e prejudicavam os consumidores e a sociedade”, disse a Receita Federal, revelando que, “elas criam modelos de negócio digitais, desburocratizando o acesso a serviços como pagamentos, crédito, seguros e investimentos, com custos geralmente menores”.
Fintechs
Um dos pontos centrais do esquema era o uso de fintechs para a realização de operações financeiras. O principal objetivo era dificultar o rastreamento dos valores movimentados. Segundo as investigações, uma dessas empresas atuava como banco paralelo da organização e movimentou sozinha R$ 46 bilhões não rastreáveis no período.
Divulgação/Receita Federal
A fintech também recebia diretamente valores em espécie. Entre 2022 e 2023, foram efetuados mais de 10,9 mil depósitos em espécie, totalizando mais de R$ 61 milhões.
Segundo a Receita Federal, este é um procedimento completamente estranho à natureza de uma instituição de pagamento, que opera apenas dinheiro escritural. “A utilização de fintechs pelo crime organizado objetiva aproveitar brechas na regulação desse tipo de instituição. Essas brechas impedem o rastreamento do fluxo dos recursos e a identificação, pelos órgãos de controle e de fiscalização, dos valores movimentados por cada um dos clientes”, explicou o órgão.
O que são as fintechs?
Segundo o Banco Central, fintechs são empresas que introduzem inovações nos mercados financeiros por meio do uso intenso de tecnologia, com potencial para criar novos modelos de negócios. Atuam por meio de plataformas online e oferecem serviços digitais inovadores relacionados ao setor.
No Brasil, há várias categorias de fintechs: de crédito, de pagamento, gestão financeira, empréstimo, investimento, financiamento, seguro, negociação de dívidas, câmbio, e multisserviços.
Podem ser autorizadas a funcionar no país dois tipos de fintechs de crédito – para intermediação entre credores e devedores por meio de negociações realizadas em meio eletrônico: a Sociedade de Crédito Direto (SCD) e a Sociedade de Empréstimo entre Pessoas (SEP), cujas operações constarão do Sistema de Informações de Créditos (SCR).
“Conta-bolsão” e outras brechas
Segundo a Receita Federal, uma dessas brechas é a utilização da “conta-bolsão”, uma conta aberta em nome da própria fintech em um banco comercial por onde transitam de forma não segregada recursos de todos os seus clientes.
“Era dessa forma que as operações de compensação financeira entre as distribuidoras e os postos de combustíveis eram realizadas, assim como compensações financeiras entre as empresas e os fundos de investimentos administrados pela própria organização criminosa”, explica a Receita.
Outra brecha é a não obrigatoriedade de prestação de informações à Receita Federal sobre as operações financeiras dos clientes por meio da e-Financeira.
Em 2024, a Receita Federal promoveu alterações normativas referentes à e-Financeira visando dar maior transparência e diminuir a opacidade das instituições de pagamento, alterações essas revogadas no início de 2025 após onda de fake news sobre o tema.
Lavagem de dinheiro
As formuladoras, as distribuidoras e os postos de combustíveis também eram usados para lavar dinheiro de origem ilícita. Há indícios de que as lojas de conveniência e as administradoras desses postos, além de padarias, também participavam do esquema.
Auditores-fiscais da Receita Federal identificaram irregularidades em mais de 1.000 postos de combustíveis distribuídos em 10 estados. São eles: São Paulo, Bahia, Goiás, Paraná, Rio Grande do Sul, Minas Gerais, Maranhão, Piauí, Rio de Janeiro e Tocantins.
Segundo a Receita, a maioria desses postos tinha o papel de receber dinheiro em espécie ou via maquininhas de cartão e transitar recursos do crime para a organização criminosa por meio de suas contas bancárias no esquema de lavagem de dinheiro.
52 bi
Entre 2020 e 2024, a movimentação financeira desses postos foi de R$ 52 bilhões, com recolhimento de tributos muito baixo e incompatível com suas atividades. Os postos já foram autuados pela Receita Federal em mais de R$ 891 milhões.
No entanto, cerca de 140 postos eram usados de outra forma. Eles não tiveram qualquer movimentação entre 2020 e 2024, mas, mesmo assim, foram destinatários de mais de R$ 2 bilhões em notas fiscais de combustíveis. “Possivelmente, essas aquisições simuladas serviram para ocultar o trânsito de valores ilícitos depositados nas distribuidoras vinculadas à organização criminosa”.
Órgãos envolvidos
Participam da operação cerca de 350 servidores da Receita Federal, além de servidores do Ministério Público de São Paulo (MPSP), por intermédio do Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (Gaeco); Ministério Público Federal, por meio do Gaeco; Polícia Federal; Polícias Civil e Militar; Secretaria da Fazenda e Planejamento do Estado de São Paulo (Sefaz/SP); Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP); e Procuradoria-Geral do Estado de São Paulo (PGE/SP).
Outras operações
Além da megaoperação mirando esquema bilionário ligado ao PCC, a Polícia Federal e a Receita Federal deflagraram outras duas operações simultâneas contra grupos criminosos que atuam na cadeia produtiva de combustíveis.
Operação Quasar – A Justiça autorizou o bloqueio de R$ 1,2 bilhão de investigados, além do cumprimento de 12 mandados de busca em São Paulo, Campinas e Ribeirão Preto. Entre as estratégias usadas estavam transações simuladas de compra e venda de ativos.
Operação Tank – Já no Paraná, outro esquema é suspeito de ter movimentado mais de R$ 23 bilhões desde 2019. Pelo menos 46 postos de combustíveis em Curitiba (PR) estão envolvidos em fraudes como a “bomba baixa”, quando o volume abastecido é inferior ao indicado. Foram expedidos 14 mandados de prisão e 42 de busca e apreensão nos estados do Paraná, São Paulo e Rio de Janeiro.