Com o avanço da investigação sobre a atuação da “Abin paralela” durante o governo de Jair Bolsonaro, a Polícia Federal afirmou que o sistema First Mile – que rastreia o deslocamento de um celular a partir de torres de telecomunicações – não foi o único usado pelo grupo sob suspeita de espionagem ilegal de autoridades.
A corporação identificou sistemas “ilegítimos” pagos em dólar e euro para uso em “casos mais sensíveis”, que envolviam a arapongagem de ministros do Supremo Tribunal Federal e políticos. O uso desses softwares foi constatado, conforme a PF, em mensagens trocadas entre dois investigados, Marcelo Araújo Bormevet e Giancarlo Gomes Rodrigues.
Presos preventivamente ontem, os dois atuavam no Centro de Inteligência Nacional da Agência Brasileira de Inteligência na gestão de Alexandre Ramagem. No diálogo mencionado no relatório da PF, a dupla discute a produção de um dossiê sobre o ministro do Supremo Alexandre de Moraes no qual tentam associar o magistrado a uma suposta investigação sobre corrupção.
O “levantamento” foi realizado em junho de 2020, época em que o Supremo havia confirmado a legalidade do inquérito das fake news. As informações constam do relatório da PF e do parecer da Procuradoria-Geral da República que levaram à abertura da quarta fase da Operação Última Milha, na manhã de ontem.
‘Violência’
Ao analisar a conversa dos ex-auxiliares de Ramagem na Abin sobre Moraes, a PF apontou “indicativo de violência e ações relacionadas à tentativa de impeachment” do ministro do STF. No diálogo, um deles escreveu: “Tá ficando f… isso. Esse careca (Moraes) está merecendo algo a mais”. A resposta foi: “Só 7.62”, uma referência, para a PF, ao número do calibre de uma munição. “Head shot”, finaliza o interlocutor. Head shot significa tiro na cabeça.
Para a Procuradoria-Geral da República, a opção por sistemas clandestinos se dava em razão de eles facilitarem a ocultação dos rastros da espionagem. A PF disse que há diligências em andamento para apurar a “extensão do uso de outras aplicações de monitoramento clandestino”.
No caso das ações contra ministros do STF, a PF apontou atentado ao livre poder do Judiciário, além de tentativa de embaraço a investigações e tentativa de desacreditar o sistema eleitoral. Os investigadores disseram que a “Abin paralela” tentou ligar magistrados e políticos de oposição a Bolsonaro ao PCC. Ainda de acordo com a PF, a estrutura paralela da Abin foi “politizada” e promoveu “ações de inteligência” para atacar as urnas eletrônicas e o sistema eleitoral.
A reportagem do Estadão procurou as defesas de Marcelo Araújo Bormevet e de Giancarlo Gomes Rodrigues, mas não houve manifestação até a publicação deste texto.
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.